O assunto virou tabu: espécie exótica é do mal;
nativa, do bem. Polarização falaciosaEspécies exóticas, sejam plantas ou
animais, consideram-se as originadas nos ecossistemas de regiões distintas da
local, ou seja, estrangeiras. São exóticas no Brasil, por exemplo, as árvores
típicas da Europa, como o cipreste italiano. Da mesma forma, vieram de longe
para a arborização urbana a enorme tipuana (argentina), o lindo flamboyant
(africano), a falsa-seringueira (asiática) e o álamo (canadense). Apenas a
sibipiruna ou os coloridos ipês são nativos do Brasil. Nenhum cidadão discrimina
a sombra fresca que todas oferecem ao calor do asfalto.
Imperam também,
dentre as frutas encontradas na mesa dos brasileiros, as variedades importadas.
A banana, a laranja e o figo têm origem na Ásia, enquanto o abacate e o abacaxi
vieram da América Central. Variadas origens caracterizam a fruticultura, como no
caso da melancia (africana), da manga e da jaca (indianas), da maçã (siberiana),
do caqui e do pêssego (chineses), da uva (do Oriente Médio), do moranguinho
(europeu).
O mamão é americano. Latino-americanas são a pitanga e a
goiaba. Brasileira, mesmo, fica a jabuticaba.Assunto curioso. Veja o caso de
verduras e legumes. Nesses vegetais se destacam as exóticas cebola e alface
(asiáticas), a berinjela e o pepino (indianos), a cenoura, a beterraba e a couve
(mediterrâneas), o cará, o maxixe e o quiabo (africanos). Restam como
latino-americanos o chuchu, a abóbora e o pimentão. Sul-americano, sabidamente,
apenas o tomate.
Interessante é saber que exótica é também boa parte dos
grãos que alimentam o povo, a começar do arroz, da soja (asiáticos) e do trigo,
cujas origens se encontram na Europa e na Ásia. Amendoim, girassol, batata e
milho, por sua vez, surgiram originalmente nas montanhas andinas da América. O
café, bebida adorada pelos brasileiros, nasceu na África, a cana-de-açúcar veio
da Índia e o feijão, típico do prato nacional, tem origem difusa em vários
continentes. Verde-amarela, essa, sim, resta a mandioca, aqui relatada desde
Pero Vaz de Caminha.
Normalmente as pessoas desconhecem a origem dos
alimentos. Isso, entretanto, não as impede, nem aos próprios ecologistas
radicais, de consumi-los com apetite, independentemente da procedência.
Saborosos e nutritivos, todos têm sido fundamentais para a qualidade de vida dos
povos. Fruto do trabalho da agronomia, caíram no gosto popular e se tornaram
cosmopolitas. Viajaram o mundo.
Existe um sentido mais restrito para o
conceito de planta exótica. Também é considerado dentro de um mesmo país, ou
região, para se referir às espécies que, embora do mesmo país, tenham origem num
bioma distinto do local. Assim, no território de São Paulo, situado no bioma da
Mata Atlântica, considera-se exótica a seringueira, eis que nativa do bioma da
Amazônia. Vejam outros casos. No Nordeste, ao contrário do que muitos pensam, o
praiano caju é exótico, pois sua origem está na Floresta Amazônica; idem o
cacau, que, embora seja também amazônico, adorou viver nas terras de Ilhéus. O
coco-da-baía, destarte, ostenta no nome a terra de Jorge Amado, mas chegou da
África, trazido pelas correntes marinhas. Inusitado.
Na recente discussão
sobre o Código Florestal, o assunto da vegetação exótica tomou destaque.
Propunha-se que, sob certas condições, plantações frutíferas ou silvícolas
pudessem ser utilizadas para ajudar na recomposição de áreas de preservação
permanente, mormente as próximas dos cursos dágua. Além de proteger as beiradas
dos córregos, teriam função produtiva. Ganha a natureza, ganha o
agricultor.
Houve, porém, forte restrição dos puritanos ambientais. O
temor ecológico contra as plantas exóticas advém, primeiro, do fato de que,
sendo estranhas à flora nativa, elas não participam das cadeias produtivas
alimentares, pouco auxiliando na vida silvestre. Segundo, as espécies retiradas
de seu ecossistema nativo se livram de predadores e parasitas naturais, que lá
controlam sua população. Livres de competidores, podem se multiplicar
exageradamente, prejudicando a flora e a fauna locais.
Esse fenômeno, que
caracteriza as chamadas plantas "invasoras", é tido pelos estudiosos como a
segunda maior ameaça mundial à biodiversidade, perdendo somente para a
exploração humana na destruição dos hábitats naturais. A gravidade da
contaminação biológica causada por espécies exóticas motivou a ONU a criar, em
1997, um programa específico para enfrentá-la. A matéria, complexa, caiu nas
graças dos ecoterroristas, os que pregam a catástrofe planetária.
Em
muitos casos, providências, algumas drásticas, precisam ser tomadas para impedir
a invasão dos ecossistemas. Mas, embora exóticas, as plantas podem servir ao
bem. Basta monitorar, se necessário controlar, pôr a técnica acima do
preconceito ecológico. Nas áreas degradadas, algumas espécies florestais podem
servir como "pioneiras", sombreando as mudas nativas para que cresçam melhor,
favorecendo o processo de recuperação ambiental. Por essa razão, o novo Código
Florestal acabou permitindo, de forma restrita, o uso das exóticas em sistemas
misturados com espécies nativas.
Na Serra do Mar paulista, entre Mogi das
Cruzes e Bertioga, surpreendente recuperação da Mata Atlântica se verifica nas
sombras dos antigos eucaliptais, raleados, mantidos pela Suzano, empresa de
celulose. A silvicultura inteligente cria uma segunda natureza, que ajuda, e não
atrapalha, a civilização humana.
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